Que a Natureza seja sinónimo de Futuro
Já se passaram várias semanas, desde que todos despertámos para uma vida diferente. Fronteiras encerradas, países fechados, pessoas confinadas e separadas umas das outras, inclusive de amigos e de familiares.
Vivemos tempos sem precedentes, de dor e sofrimento, para as gerações que habitam o planeta, pelo que a Fundação Oceano Azul deseja, acima de tudo, enaltecer o esforço dos médicos, enfermeiros e todas as equipas paramédicas que, não só em Portugal, mas em todo o mundo, estão na linha da frente da luta contra a pandemia. Têm sido extraordinários pela sua dedicação e sacrifício. Nunca os iremos esquecer.
O mesmo se aplica a todas as pessoas que têm de continuar a trabalhar fora de casa, expondo-se aos riscos, para garantir infraestruturas e bens vitais, tais como os transportes, a produção (agricultura e pescas) e a distribuição de alimentos e medicamentos, forças de segurança, entre outros. Estas pessoas são o motor que mantém os nossos países a funcionar, permitindo que a maioria fique em casa.
O Oceanário de Lisboa, a janela de Portugal para o oceano, fechou as suas portas, mesmo antes de o Presidente da República ter declarado o Estado de Emergência em Portugal, para proteger os nossos visitantes e os nossos colegas de trabalho. Não obstante, apesar de ter fechado as suas portas ao público, o Oceanário não pode fechar os seus tanques a toda a vida marinha que estes contêm, tendo de continuar a funcionar em pleno. Muitos dos nossos Colegas (biólogos, engenheiros, equipas responsáveis pelos sistemas de suporte de vida) têm, assim, de sair das suas casas todos os dias para manter o Oceanário de Lisboa a funcionar. Merecem todo o nosso reconhecimento e gratidão pelo seu compromisso para com a vida marinha pela qual somos responsáveis.
Esta crise não tem precedentes, não só pela extensão dos seus impactos, mas também porque mostra o quão globalizado o mundo se tornou. Nunca tantos países em todos os continentes, e tantas pessoas tinham sido afetados pela mesma crise, da mesma forma, ao mesmo tempo. As pessoas estão a sofrer com a doença – algumas, infelizmente, não conseguindo superá-la – e por estarem separadas umas das outras. Porém, as pessoas também estão a ser afetadas pela crise económica que se criou, devido às medidas que têm de ser adotadas para combater a disseminação do vírus.
A Fundação Oceano Azul deseja expressar a sua solidariedade para com todos os que estão a ser afetados e espera sinceramente que todos os seus parceiros, stakeholders e amigos estejam bem e permaneçam bem.
Embora consciente de que a situação ainda pode piorar antes de melhorar, a Fundação Oceano Azul não irá limitar a sua atuação, permanecendo sim mobilizada pela causa do nosso planeta e do oceano. Teremos de ser ainda mais determinados, ainda mais vigilantes, se quisermos garantir que o futuro não dê um passo atrás na luta contra a crise climática e na restauração do nosso oceano. Acreditamos que todas as organizações que trabalham no sentido da conservação da natureza sairão desta crise mais sábias e fortes. Aliás, as medidas que tomarem serão mais necessárias do que nunca.
Poder-se-á aprender várias lições da crise pandémica, as quais consideramos úteis para o trabalho futuro de todas as organizações de conservação da natureza. Para começar, entre a economia e salvar vidas, a maioria das sociedades, governos e países de todo o mundo optaram por salvar vidas. É uma questão de reajustar as nossas prioridades. Se isto é válido para uma crise aguda como a pandemia, devemos trabalhar juntos para garantir que o mesmo se passará nas crises climática e ambiental há muito antecipadas. Na verdade, no contexto das nossas tremendas crises planetárias (alterações climáticas, extinção de espécies, poluição e degradação ambiental) o que está em jogo é também a necessidade de salvar vidas, incluindo as vidas das gerações mais jovens e futuras (os nossos filhos, e os seus respetivos filhos). Com esta lição em mente, trabalhemos juntos para que a velha economia insustentável não continue a ser a prioridade da próxima década e, nesse sentido, que possamos chegar a 2030 numa posição melhor para, no mínimo, cumprir o Acordo de Paris e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas.
Uma segunda lição que devemos aprender da situação atual é que todos nós (a população, e os nossos decisores políticos e económicos) devemos, de uma vez por todas, seguir a ciência. Devemos seguir a ciência para prevenir e para combater epidemias, assim como devemos seguir a ciência para enfrentar as iminentes crises climática e ambiental do planeta.
Esta crise sanitária sem precedentes também nos diz que, como espécie, devemos deixar de acreditar que detemos pleno controlo de tudo o que nos possa afetar. De que somos autossuficientes, que estamos à parte da natureza e que somos, inclusive, superiores a ela. Estas crenças têm moldado a nossa mentalidade convencional desde, pelo menos, o início da atual era moderna, influenciando as nossas opções políticas e económicas mais relevantes e não tendo suficientemente em conta a preservação da natureza.
Se compreendermos que não somos tão autossuficientes como pensávamos e que a economia não deve ser a única prioridade, sendo, de facto, um subsistema dentro do ambiente planetário e profundamente dependente dos bens e serviços dos ecossistemas, bem como do capital natural que estes incorporam, podemos tornar-nos mais abertos à agenda planetária. Podemos vir a respeitar e a valorizar a natureza, mais do que temos feito ao longo de décadas de fé na nossa espécie e na nossa tecnologia acima de tudo.
É aqui que uma nova narrativa poderá ser alicerçada: uma narrativa que se poderá designar por “narrativa do Poder da Natureza”, dado que nos irá elucidar sobre a nossa dependência do mundo natural do planeta. Tal narrativa será um poderoso aliado para uma agenda transformadora, mais amiga do planeta e oceano. Deverá ter como finalidade alcançar um estádio em que “natureza” e “futuro” se tornem sinónimos. Deverá fazer com que as pessoas e os decisores, em conjunto, escutem de outra forma a natureza e a ciência.
Esta nova narrativa poderá reforçar consideravelmente os nossos apelos para se tomar medidas. A iniciativa RISE UP / A Blue Call to Action, que a Fundação Oceano Azul, juntamente com os seus parceiros, tem vindo a promover, e que consiste num plano de 10 anos para restaurar o nosso oceano está aberta a assinaturas e o seu apoio irá permitir que este “Apelo Azul” contribua para que os decisores políticos e económicos escutem melhor os ensinamentos da natureza e da ciência.
Para a Fundação Oceano Azul, tal como para qualquer outra organização de conservação da natureza, a “Narrativa do Poder da Natureza” poderá ser, se devidamente desenvolvida, em primeiro lugar, e divulgada, em segundo lugar, um aliado importante, inesperado e crítico da causa de sustentabilidade do planeta. Um aliado que traga mudanças positivas inevitáveis mais rápidas do que o previsto.
Juntemo-nos então à iniciativa RISE UP e trabalhemos juntos para desenvolver e difundir uma Narrativa do “Poder da Natureza”!
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